Mais uma vez um livro chega em minhas mãos na hora certa. Refiro-me a “O mundo de Sofia”, de Jostein Gaarder, cuja primeira edição data de 1995. Na época de seu lançamento, lembro-me de meu pai recomendá-lo como leitura necessária. Eram tempos em que outras necessidades cruzavam meu caminho. Anotei-o. Foi para a fila.
Vinte e seis anos se passaram até eu sentir falta de uma leitura que me situasse em relação à história da filosofia ocidental. Minha vontade era específica: conhecer um pouco os filósofos do Idealismo alemão.
Tenho pesquisado uma biografia cujo protagonista estudou a fundo esses filósofos antes de desenvolver suas próprias ideias sobre o conhecimento e seus limites. O que seria esse tal de Idealismo alemão?
Consultei um primo querido, minha referência na área, e perguntei a ele como poderia ter uma visão geral desse campo do conhecimento. Ganhei uma visita em casa, um papo filosófico com café tirado na hora e a segunda indicação do mesmo título, sugerido há décadas. Foi assim que “O mundo de Sofia” passou para o primeiro lugar da fila, na hora certa.
A leitura ultrapassou meu tópico inicial de interesse. Percebi de que maneira a humanidade, ao longo dos séculos, respondeu às eternas questões de nossa existência: quem sou eu? De onde vem o mundo? Deus existe? O que é o conhecimento? Como conhecemos as coisas? O que é um boa vida?
Cada nome citado na obra poderia merecer uma vida toda de estudos, claro. O autor, no entanto, fornece um guia básico de filosofia, tecido num romance. Nele, mundos paralelos subvertem a lógica e contrariam a geometria com a vontade de se cruzarem antes do infinito. Mistura deliciosa.
As respostas variaram e continuarão variando de acordo com cada momento histórico. E ganham contornos diferentes dependendo do nosso momento de leitura. A tal água do rio que nunca é a mesma, anunciada na Antiguidade por Heráclito (satisfação de colocar o nome certo depois de citar o dito!).
Damos nossos pequenos passos no eterno movimento pendular, que num instante diz uma coisa para contestá-la, em parte ou no todo, logo em seguida. Unidade e dualidade, céu e terra, bom e ruim, certo e errado, razão e emoção, sociedade e indivíduo. Margarina versus manteiga. Biscoito versus bolacha.
Essas dualidades que sempre nos habitaram, não são estanques nem excludentes. Com o tempo, vemos que a síntese é mais do que um confronto: é montagem de quebra-cabeças interativos e complementares. Dessa complexidade surgem textos como “Boa ou ruim”, e “Briga na madrugada”. Dela também nasce a esperança de encontrarmos o terceiro pé que equilibra qualquer banqueta. É a síntese que abriga tese e antítese e nos faz enxergar além de dois polos, mesmo que temporariamente.
Elissa Khoury
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